O que o HIV tem a ver com peixes? Cegueira com água? Tudo! Especialmente se você for uma mulher no mundo em desenvolvimento e estiver tentando alimentar sua família.
Deixe-me dar três exemplos de ligações entre mulheres, sobrevivência e recursos naturais:
Florestas são lugares ricos e seguros para muitos indivíduos em pobreza no mundo; elas provêm comida, água, medicina e energia. Mas, em muitos lugares, as florestas estão em declínio. Isso significa que há poucas árvores que necessitam lidar com coisas importantes como providenciar chuvas, proteger o solo e oferecer abrigo à pássaros, primatas e outros animais, que, individualmente, também desempenham papéis importantes na manutenção do ecossistema; e, francamente, tornam o mundo um lugar mais interessante para se viver.
Enquanto as florestas desaparecem, mulheres que precisam coletar madeira para cozer alimentos precisam se distanciar mais e mais de suas comunidades seguras afim de encontrar recursos. E frequentemente elas são estupradas no caminho. É estimado que aproximadamente 90% dos casos de estupro que ocorrem na região da África Sub-Saariana acontecem quando mulheres estão longe de suas vilas coletando água, alimentos e lenha. A alternativa é mudar para outra fonte de combustível, como o esterco, gerando consequências terríveis para a saúde. Na verdade, a poluição do ar interno pela queima de combustíveis tóxicos resulta na morte de mais mulheres e crianças por ano do que a malária.
Em muitos lugares do mundo, a pesca está entrando em colapso. À medida que um tipo de peixe desaparece, os impactos se propagam por todo o ecossistema marinho. Por exemplo, se os peixes que comem algas são pescados em excesso, as algas começam a crescer de forma descontrolada e impedem a sobrevivência de outros seres, como os corais. Os corais fornecem habitats que tendem a suportar mais diversidade, uma característica valorizada por muitas razões, incluindo o fato de que geralmente fornecem lares para muito mais peixes que podem ser capturados e comidos.
Quando as peixarias colapsam nós sabemos que os peixeiros perdem seus empregos, mas e quanto às pessoas que limpam, tratam e vendem os peixes? Essas pessoas são mulheres em sua maioria. Quando peixarias colapsam, mulheres tem mais dificuldade em encontrar outros trabalhos locais ou viajar em busca de novas oportunidades. Então, durante a perda de fontes de renda seguras, as mulheres ficam em segundo plano, com poucas opções econômicas, frequentemente sendo obrigadas a trocar sexo por comida afim de alimentar seus filhos. Isso, combinado com outros fatores, resulta em níveis elevados de contaminação da população em comunidades peixeiras com HIV/AIDs.
Considere esses três exemplos:
• Treze a vinte por cento das tribulações de barcos pescadores na Tailândia testaram positivo para HIV enquanto a taxa, enquanto a taxa geral da população tailandesa soropositiva foi de 1,5 por cento.
• Os pescadores têm cinco vezes mais probabilidade de morrer de doenças relacionadas à AIDS do que os agricultores da região do Lago Vitória, no continente africano.
• Em algumas comunidades pesqueiras na África, para cada jovem que contrai HIV / AIDS, nove meninas também o adquirem. Isso mesmo. Nove.
80% do esgoto de países em desenvolvimento é lançado sem tratamento em rios, córregos e áreas costeiras. Esse despejo impacta grandemente os recursos hídricos, tornando os lugares em que eles estão disponíveis em locais onde você não gostaria de nadar ou comer peixes que foram capturados neles, muito menos beber a água ou dar banho em seus filhos. Além de tornar os habitats de água doce e salgada em lugares bastante desagradáveis, o esgoto também contribui para a criação de zonas mortas: enormes áreas nos oceanos que aniquilam qualquer forma de vida.
Mas nos países em desenvolvimento os impactos da água contaminada são muito mais pessoais. São a causa de cegueiras, cólera, disenterias, hepatite e diversas outras doenças que afetam as mulheres de forma desproporcional, principalmente porque são as mulheres que entram em contato com a água com mais frequência, pois são as principais fornecedoras desse importante recurso em seus lares.
Esses não são apenas fatos aleatórios derivados de estatísticas terríveis da Internet. Esta é a realidade de 60% da população pobre do mundo que vive em habitats ecologicamente vulneráveis. Em Bangladesh, cerca de 90% das pessoas dependem de recursos naturais para sobreviver. Nas áreas da África Subsaariana, o número pode chegar a 95%.
Uma vez que a maioria da população pobre mundial são mulheres, a ligação entre a sobrevivência básica e a gestão dos recursos naturais é enviesada pelo gênero. Para piorar as coisas, a ajuda aos pobres rurais diminuiu 50% entre 1987 e 2007. Portanto, essas mulheres estão perdendo na frente da conservação e do desenvolvimento.
Quando lançamos o Novo Curso, decidimos fazer duas coisas:
1) Envolver as mulheres na conservação e desenvolvimento.
2) Ajudar nossos parceiros a reconhecer que os objetivos de desenvolvimento e conservação estão interligados.
Desde o primeiro dia, nos disseram "você é uma organização de desenvolvimento ou uma organização de conservação! - você não pode ser as duas coisas."
Eu não acredito nisso. Uma batalha bem-sucedida contra a pobreza ou a degradação dos recursos naturais não vai acontecer com a equipe de "gestão ambiental" lutando contra a do "bem-estar humano". Quando você olha o quadro geral e os objetivos de longo prazo dessas “equipes”, eles estão alinhados e são interdependentes. Não podemos ter pessoas saudáveis se não tivermos florestas e oceanos saudáveis. E não podemos esperar que os recursos das florestas e oceanos sejam reservados em áreas protegidas intocadas, quando as pessoas não têm comida para comer, água para beber e nenhuma fonte de energia para utilizar.
O que acreditamos, o que sabemos, é que às vezes o sucesso só pode ser alcançado se você for uma organização de desenvolvimento e uma organização de conservação. E na maioria das vezes, o sucesso só pode ser alcançado se você envolver as mulheres que lidam diariamente com a realidade da degradação dos recursos naturais e da pobreza. Existem soluções para os problemas da pobreza e degradação dos recursos naturais que são possíveis e práticas. É hora de trabalharmos juntos para encontrá-los.
Tradução própria
Texto original em: What Does Rape Have To Do With Trees? | HuffPost